A falta é irresponsável



Sua voz, vire e mexe, volta a ecoar na minha cabeça. Eu nem sei dizer se ela é realmente dessa maneira que minha mente projeta, mas gosto de pensar que sim. Também não consigo mensurar tempo e espaço pra conseguir ter a certeza de quão longe está agora e há quantas mil horas eu não te vejo mais. Costumo pensar que isso aqui, esse agora, seja só uma fração de tantos outros mundos que nós poderíamos estar. Multiverso? Matrix? Eu não sei, mas quero acreditar que em qualquer outro espaço, estrela e órbita, nossos corações ainda batem juntos. Se o alinhamento dos planetas chegasse agora, talvez não estaríamos, cada um, fora de algum. Será que encontraríamos casa? O real sentido do amor? As respostas para as dúvidas lendárias? Informações precisas da biblioteca do Vaticano? Talvez eu não viva o tempo suficiente para ver o homem fazer residência em Marte, mas adoro acreditar que as coisas acontecem quando devem acontecer. Toda dor que um dia pesou a fé, talvez, tenha sido proposital para sabermos que somos reais, ou desse planeta. Enquanto isso, aqui, tenho dado tudo de mim. Por hora, talvez, não seja o suficiente, mas é. Fico assistindo todas as suas - e de tantas outras pessoas - conquistas e me dá um frio estranho na barriga. Não tínhamos combinado de contar sobre nossos sonhos? De seguramos o peso da vida juntos? De dividir os ganhos? De sermos felizes? Talvez você já tenha pego o próximo foguete rumo a algum ponto qualquer no espaço, ou talvez já tenha encontrado a sua nova estrela preferida no céu. O que será que acontece quando as noites chegam ao fim? Será que preciso encontrar alguma coisa em mim que faça eu me mudar de vez, pra Curitiba, pra Itália ou alguma cidadezinha afastada do centro de São Paulo? Que da vontade, da, não é coração? Só a gente sabe o quanto aguentou até aqui. Nessa hora, metade do país reclama do calor, outra, do desamor instaurado em cada pedaço de coração. Pra qual lugar correr, eu não sei, pra qual time torcer, qual a melodia perfeita para a conexão dos acasos, eu também não sei. Continuo achando que o mundo, as pessoas, as sobreposições das falhas andam tremendamente esquisitas. Deve ter tido alguma coisa a ver com as constelações ou sobre os signos mutantes que, felizmente, são insolussionáveis seus mistérios. Eu não vou mais me enganar pra dizer que a sua falta não faz mais morada. Porque ela faz. Ela se faz como pedaços de um coração rasgado jogados em todos os cantos dessa cidade que insistem em se encontrar, todos de uma vez, nestas noites que custam a passar. Quais são as cores das estações do metrô? Ou em qual ponto ele atinge sua maior velocidade pra ir de encontro a próxima parada? Em que momento você descobre como andar sozinho pelas ruas sem temer o que não conhece? Eu não sei dizer qual foi a hora exata que perdi cada fragmento de felicidade que podia segurar com os teus olhos nos meus, mas sei dizer que talvez ainda seja difícil sentir perfumes que não o teu. Olha, a sua luz não está mais comigo. Os meus novos voos vieram para decretar o começo da minha abstenção de qualquer vestígio que você deixou. Por causa do que você me mostrou, sobre o místico e sobre a dor interminável de qualquer parte do meu ser, eu sei que, hoje, exista quem realmente possa amar o que, de fato, eu sou. Com todas as minhas divisões possíveis ou aqueles detalhes pequeninos que quase ninguém nota. Até uns meses atrás eu me importava. Mas, agora, o que você fez, qual a nova forma de me machucar você inventou, eu não me importo. De que cor são os olhos da sua nova morada, de que corpo você coloca pra se deitar nas noites frias, qual seu novo orixá, seu partido político, sua forma física, qual das suas cicatrizes do passado ainda doem, quem é seu pai, quem foi seus amores, pedal fuzz ou guitarra verde limão, qual seu novo perfume, quantas vezes sonha comigo, em que música pensa em mim, qual os quadros novos da sala, qual das entradas erradas da marginal você entra. Não me importa. É impossível, mas isto é verdadeiro. Há mais de uma década crescemos juntos, distraidamente. As formas da árvores mudaram conosco. Nosso entendimento sobre a vida, o amor e o que precisa durar, se tornou mutante. Não sei mais nada sobre a paixão e sobre como as pessoas nos machucam. É, a luz dos recomeços entraram na minha pele e eu pude enxergar este tremendo agora. Comecei a entender que o compasso da minha fé na vida mudou em passos largos, mas demorados. É metade medo, metade desespero e, provavelmente, esquecimento. Agora que os planetas estão fora de órbita, as danças com outros sons e a vida com outros par de olhos para eu me encantar, eu caminho até o fim para acreditar que eu vou atravessar a chuva passada para continuar doando cada parte desse coração rasgado para quem, finalmente, possa me merecer.

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