massa do falível



Há dor em todos os lados que olho. As pessoas sofrem. O inferno está no ar. E é quando chegamos perto do inferno que lembramos da necessidade de ter um pequeno céu para fugir. Um pequeno espaço fora da vida para gente poder viver.

São nestes momentos em que tudo o que as pessoas conseguem trazer é a dor. É nessas horas que a melancolia chega, sorrateira, sempre à espera de uma defesa ferida para poder ferir. Mas a gente lembra que o mundo vale a pena. Que ainda merecemos continuar. É quando a melancolia chega que percebemos que são as pessoas que nos salvam do abismo. É quando o abismo se aproxima que as pessoas servem para nos agarrar e para nos permitir a salvação. Hoje quero desistir, mas ao mesmo tempo quero viver para sempre.

Porque eu desaprendi com a vida tantas coisas que ela me deu.

Desaprendi a amar o futuro: porque o que me resta dele é esta alma tão pronta para continuar e um corpo tão pronto pra se perder. E para que serve haver depois de mim se não estarei aqui para viver? Desaprendia perceber as coisas que o mundo contém. As pessoas que gastam suas vidas na vida de outros, na felicidade dos outros a martirizar a própria; pessoas que se agarram ao tanto que têm e não percebem que nunca o terão.  Desaprendi a preservar o instante porque eles já são tão poucos. Como se houvesse um local para cada momento, um espaço certo para cada sensação exata.

E agora não quero mais do que um fragmento, porque é só assim que me sinto inteira.

Há dor em todos os nós. O resto aperta pequenos laços. O inferno está bem no fundo do que existe em nós para que possamos suportar o que ainda está por vir. Há sempre mais um estrato de dor para experimentar: e só quem é sólido em todos os estratos até esse consegue aguentar o impacto da dor que ainda está por vir.

Viver a dor é não conseguir suportar os reveses da vida.

A dor acontece. Não há nada a se fazer. E ela é imprevisível. Ninguém consegue prever a dor. Estar preparado para a dor é saber todos os seus passos, medir cada movimento da vida. Negar a existência da dor é negar a própria existência. Somos feitos da massa de vontade de viver.

E estar vivo consiste em não morrer
(e até agora tenho me dado bem nesta tarefa de ser imortal)

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