Daquelas coisas que a gente leva tempo para enxergar





Você nunca tinha tempo para me ouvir falar do meu escritor favorito, mas eu aceitava. Eu sentia saudade de você, mas você parecia nunca ter tempo quando eu realmente precisava. Queria chegar em casa e te contar como foi meu dia, ouvir sobre as tuas aulas, ou qualquer coisa besta que você fazia durante a tarde inteira sem nada para fazer. Mas você era ausente. Você não estava querendo ser presença, mas eu aceitava.

Eu sempre fui a pessoa que aceitava o que era me dado, ora pequenos instantes de alegria, ora aqueles momentos que eu sei que eu poderia atrapalhar. Me deparei com você puxando assunto com outras pessoas e dando margem a uma conversa que me desrespeitava. No fim, você me dizia que só estava querendo ser simpático com os outros, quando na verdade, você não estava preocupado em me respeitar. Tudo bem, eu aceitava.

Quando eu te flagrei flertando outras pessoas e retribuindo uma paquera, você disse que só estava tentando fazer novos amigos. Você não estava a fim de ser sincero comigo, mas eu aceitava. Só não enxergava. Quando eu te questionava você me chamava de desequilibrada, dizia que eu estava louca para tentar me convencer de que eu realmente não te merecia. Você não estava a fim de ser sincero comigo, mas eu aceitava.

Quando percebi o quanto você mentia, pedia explicações e você sempre começava a conversa dizendo que me amava e terminava a discussão dizendo que eu viajava demais. Eu voltava para meus problemas achando que o erro era em mim. Você me pedia desculpas, mas não durava muito tempo para fazer os mesmos erros novamente. Você não tinha intensão alguma de me levar a sério, mas eu aceitava.

Eu não enxergava.

Levei muito tempo para enxergar, mas eu realmente precisei passar por tudo isso para entender que o meu mundo não deveria girar em torno de você. Demorou muito tempo para enxergar que você não merecia mais nenhuma lágrima ou qualquer coisa que viesse de mim. Eu tive que suportar a saudade e a falta que você me fez para só assim saber que saudade boa não dói, e sentir falta de alguém que escolheu ir embora não vale a pena. Eu tive que aguentar o vazio que ficou para aprender como decorar sozinha esses espaços enormes que você deixou com pedaços de mim mesma.

Eu não enxergava.

Demorei tempo demais para enxergar, mas hoje eu percebi que tudo o que dizia aos quatro cantos do mundo eram apenas fragmentos do cara fracassado que você sempre foi, porque ninguém em sã consciência diz a mesma coisa para o amor da sua vida, e depois diz para uma pessoa que acabou de conhecer. Eu preciso crer que as pessoas não são rudes como você é.

Levei muito tempo para enxergar que você estava mal-acostumado, porque eu sempre estive aqui. Eu nunca havia partido de fato, e você sabia, porque todas as vezes eu te desculpei, todas as vezes eu acreditei em você. Todas as vezes eu apostei em você. Mas você não estava maduro o suficiente pra perceber isso. Você não foi homem o bastante para entender que a menina que você conheceu se tornaria uma mulher um dia, que seria capaz de rebater as suas traições, as suas mentiras, as suas esquisitices e as suas filhadaputagens.

Eu sei, demorei tempo demais para enxergar, mas depois de você eu passei a não ter mais paciência pra tolerar erros, pra engolir tantos defeitos, e aceitar repetições dos outros. É que todo mundo parecia carregar um pouco de você, e então, eu evitava me envolver. Erro meu.

Mas eu não enxergava.

Não enxergava que o tempo passa, e a gente começa a perceber que a decepção dói mas não mata, e é com ela que a gente deve aprender a lidar e amadurecer pra vida. Depois de você eu finalmente aprendi que isso nunca foi uma perda, foi um favor que você fez pra mim. Aprendi também que nem o amor, nem ninguém tem culpa disso. Ninguém seria capaz de fazer o que você fez. Demorei pra enxergar, mas depois de você, eu amadureci.

Demorei tempo demais para enxergar, mas eu finalmente consigo mensurar que o amor que eu senti por você foi real, e mesmo que no final de tudo tenha doído em mim, uma coisa eu aprendi com tudo isso: que eu não te perdi, eu me livrei.

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