Parede sem janelas

Meu fígado doía demais, culpa das 7 caipirinhas que havia tomado na noite passada. Das 7 caipirinhas, 5 cervejas, uma dose de pinga e outra de whisky. Nem sei que forma tinha, só sei que a minha cabeça ficou roxa com mais um galo, culpa da porta da sala que colocaram ali justo no dia que só conseguia trançar as pernas. Eu nunca reparei naquela porta, não como aquele dia. Eu também nunca tinha reparado na cadeira de madeira que minha mãe colocou na cozinha. Cai sem rodeios. O telefone tocava mas eu não conseguia atender. Meu pai roncava como de costume e chamava alguém em sonhos. Só acordei com o miado da minha gata, que há tempos não acariciava. Não lembro de mais nada. Eu tinha que me levantar pro trabalho. O café nunca foi tão doce, que me perdi nos degraus de entrada. Meu mundo ainda girava e eu fiquei em choque quando olhei pra frente. Até esfreguei os olhos pra ver se era o mundo rodando mesmo ou se era verdade: André fechara sua janela. Não como de costume, mas com tijolos. Veio um filme rápido de todas as conversas que tivemos entre aquele vidro retorcido de seu banheiro e a minha escada. É estranho meu fígado doer e não ter com quem conversar ao acordar ou dormir. Estranho ir até a porta e não ter pra onde olhar. Querendo ou não, toda vez que lavava seus cabelos, meus olhos se perdiam e eu não conseguia pensar em nada. Não é de amor que eu estou falando. É de atenção. Fiquei confusa. Há uma parede na minha mente, sem janela alguma, que eu não havia reparado. Sem os olhos de André. Sem os seus acordes. Eu vou enlouquecer. Mas será que esse tempo todo André não passava de um fruto da minha imaginação ou será que a minha imaginação era fruto do André?

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